quinta-feira, 5 de junho de 2008

FOTOGRAFIA, ENSINO E CELULARES IV



O DESAFIO
Um dos grandes desafios atuais do ensino de fotojornalismo é fazer com que o aluno compreenda que há conotações sociais projetadas nas fotografias jornalísticas e que esta conotação é capaz de construir/interferir um discurso e/ou moldar as relações entre os interlocutores, seus enunciados e seus referentes.
Fotografar se aprende fotografando e lendo fotografias, sempre foi uma das máximas de minhas aulas. Comecei a ensinar fotojornalismo em 1992.
Naquele tempo, imaginava que o ideal seria ter alunos que carregassem uma câmera nas mãos, 24 horas por dia. Mal poderia imaginar que no século seguinte isso se tornaria realidade. Porém o que se observa é que o aparato, ao contrário de educar o olhar o desvirtua na medida em que impede a compreensão da fotografia enquanto uma narrativa e como tal, se serve de elementos de cognição e discurso.
Nos grandes jornais, fotógrafos que aprenderam a fotografar com equipamentos mecânicos, revelar em condições extremas, como os banheiros dos hotéis e não poucas vezes utilizando a água do vaso sanitário para lavar o filme revelado, se adaptam às novas redações.
Esses fotógrafos são possuidores de talento incomum, decorrente do olhar acostumado a recortar a cena antes mesmo de observar através da objetiva. Junto a eles alguns jovens que são apaixonados pela fotografia e se submetem a compreendê-la, são o suporte da fotografia jornalística de qualidade.
São repórteres fotográficos que possuem um olhar mais apurado, uma lentidão necessária ao momento de observar, e uma rapidez de disparo no momento decisivo, para citar Cartier-Bresson.
Parece sensato concluir que o que importa ensinar ao aluno de fotojornalismo, mais do que a técnica fotográfica, é a possibilidade de ele apresentar uma capacidade de desenvolver temas, contar histórias e ver a narrativa dos fatos com ética e alto senso de responsabilidade.
Aliado a isto é importante fazer retroceder a impaciência e conduzir o aluno a uma atitude mais contemplativa na qual ele possa absorver os elementos que compõem as relações sociais que podem ser registrados nos centésimos de segundos que o aparato se abre ao mundo, e ser fixado em película ou códigos numéricos.
Finalmente, cumpre realçar que fotografia, possuidora de uma certa universalidade, só adquire sentido quando se estabelece uma relação entre o conteúdo e a ação geradora do fato.
Como provocação me atrevo a propor duas questões: será necessário dar sentido à fotografia quando o fotógrafo a compreende como código narrativo? Teríamos então um outro desafio: Ensinar ao leitor que trate da fotografia com certa singeleza, quase delicadeza, a mesma com a qual trataria o “algo-mais-sublime”, seja ele qual for, dentro de seu repertório?
Fim
Foto: celebração da Páscoa no Mosteiro da Ressurreição - Ponta Grossa

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