domingo, 1 de junho de 2008

FOTOGRAFIA ENSINO E CELULARES I



Este é o resumo de um artigo que publiquei no livro: Jornalismo, reflexões e experiências, editado pela Pós-escrito em 2007.
O nome do artigo é o mesmo do título desta postagem.

O rápido avanço tecnológico, a popularização da telefonia, graças ao baixo custo de aquisição e manutenção de aparelhos celulares, e o caráter de status agregado ao aparato, levaram para dentro das salas de aula celulares cada vez mais sofisticados. Companheiros inseparáveis dos alunos, os aparelhinhos que no século passado eram responsáveis por facilitar a conversação e minimizar a privacidade - tenho um celular, logo, obrigatoriamente, sou encontrado e quando não, sou questionado - passaram a ter, entre outras, a função de fotografar.
A cada ano, novos alunos entram entusiasmados no curso de Jornalismo e se apresentam cada vez mais paramentados com novos aparelhos e dominando a técnica fotográfica dos celulares.
Porém, fotografar não é somente dominar um conjunto de técnicas. A linguagem fotográfica é repleta de complexidades que devem ser compreendidas por aqueles que estudam jornalismo.
Desde a invenção da fotografia, debate-se sobre ela enquanto forma e linguagem. No fotojornalismo, a discussão se dá em torno do conjunto dos elementos estéticos, éticos e de informação da imagem.
Os primeiros profissionais aperfeiçoadores da fotografia, foram químicos e físicos que buscavam apreender a imagem em haletos de prata e fixá-la. Vencidos os primeiros desafios, George Eastmam (leia-se Kodak) conseguiu popularizar a fotografia. Seu empreendimento aliou tanto tecnologia quanto técnicas de venda. Com o intuito de popularizar a fotografia o empresário patenteou o filme em rolo e criou uma câmera popular que divulgou com a frase: “Você aperta o botão e nós fazemos o resto”. Bastou uma boa campanha e as câmeras fotográficas passaram a fazer parte do universo de grande parte da população mundial. A fotografia, antes restrita a um pequeno número de curiosos com poder aquisitivo e que viam na nova tecnologia a possibilidade de registrar o mundo, passou a compor um novo espaço: o de álbuns de família.
Baynes (in Souza) sugere que em 1904 o primeiro tablóide fotográfico, o inglês Daily Mirror retirou da fotografia o estigma de "ilustração" e a elevou ao nível da escrita, enquanto importância de conteúdo. Observação adequada é a de que o mesmo Daily Mirror publicou em 2004 fotos falsas mostrando supostos abusos de prisioneiros pelas tropas britânicas no Iraque.
Em 102 anos, a fotografia jornalística passou por diversas fases de adaptação às tecnologias que procuram facilitar e agilizar o processo de captação e impressão.
Câmeras menores, filmes mais sensíveis e com maior definição, flashes mais potentes e com luz mais difusa, objetivas mais luminosas foram importantes para que a fotografia jornalística evoluísse como linguagem, e a própria linguagem e credibilidade que a fotografia passou a ter exigiu do mercado novas invenções.
Às inovações tecnológicas juntou-se a compreensão da fotografia enquanto linguagem e também a reflexão sobre a recepção.
Para elaborar sua tese sobre a fotografia Roland Barthes observou que “a foto pode ser objeto de três práticas (ou de três emoções, ou de três intenções): fazer, suportar, olhar”. O fazer se refere ao Operator, àquele que fotografa. O suporte fotográfico é o Spectrum ou aquele, aquela ou aquilo que se deixa fotografar. E finalmente o Spectator é todo aquele que consome as informações que a fotografia apresenta.
O espectador que ao se deparar com um número cada vez maior de imagens em seu cotidiano, deixou de percebê-la, passou a fazer parte das preocupações daqueles que fotografam e, principalmente daqueles que vendem as publicações nas quais elas estão inseridas. Para chamar a atenção do leitor, a fotografia jornalística passou a resvalar em terrenos perigosos como os do sensacionalismo, da intrusão, espetacularização e recentemente da manipulação digital.
Santaella no livro Imagem: Cognição, Semiótica e Mídia aponta para três momentos da fotografia: pré-fotográfico, fotográfico e pós-fotográfico. O momento pré-fotográfico é o da imagem antes do advento da fotografia, desde as imagens rupestres às ilustrações. O Fotográfico durou desde a invenção da fotografia até o surgimento da tecnologia digital.
Essas distinções ou paradigmas, longe de serem meramente uma marcação temporal/cronológica do processo fotográfico, são os pontos de partida para reflexões sobre o caráter documental da fotografia e a dificuldade de ensinar fotografia em tempos de celular fotográfico.
Se por um lado a tecnologia fotográfica serve para ajustar ou re (alocar) o tempo entre o ato de fotografar e a página impressa, por outro, quando mal utilizada, a banaliza.
Barthes discorreu sobre a fotografia a partir de duas das três práticas: Spectator e Spectrum. O autor, distante da tecnologia digital que permite ver imediatamente o que se produz, justifica pelo fato de não ser fotógrafo o não questionamento do ato de fotografar: “Uma dessas práticas me estava barrada e eu não devia procurar questiona-la: não sou fotógrafo, sequer amador: muito impaciente para isso: preciso ver imediatamente o que produzi”
A ação do que fotografa (Operator) e uma inquietação sobre o ensino do fotojornalismo são os elementos geradores desta discussão que, em particular, se desenvolve em torno das novas tecnologias que ampliam a interface do jornalismo e apontam para a necessidade de mudança na formação jornalística. Essa necessidade se apresenta pelo fato de o aluno de fotojornalismo adaptado ao aparato tecnológico, parece não compreender, com exatidão, a linguagem e a importância da fotografia enquanto registro complexo da história e que pode causar grande impacto naquele que é o gerador da informação (Spectrum) e também naquele que a contempla (Spectator).

Continua....

Nenhum comentário: